(e-)Leitor, prepare-se: passado o carnaval, começará, a partir de agora e até o final de setembro, a temporada de divulgação das pesquisas eleitorais registradas no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em obediência à legislação eleitoral.
Enquanto setores da sociedade direcionam sua atenção ao combate à desinformação (fake news) com uso das mídias sociais, como ameaça à democracia, um aspecto relevante do debate político ainda é discutido de forma lateral, menor: o falseamento estratégico, por políticos, da divulgação de pesquisas eleitorais como instrumento de difusão em massa de fake news.
Abordei essa problemática no mestrado (veja aqui), a partir do recorte da disputa ao governo do estado em 2022, e muitos números derivados do trabalho chamaram atenção: o volume de gastos com pesquisas (cerca de R$ 1,5 milhão), a quantidade de levantamentos realizados em 9 meses (57), o índice de acerto (1 de 57), a oscilação de preço de entrevista individual das pesquisas registradas de até 1530% entre a mais barata ( R$ 5,33) e a mais cara (R$ 81,83), a quantidade reduzida de contratantes (apenas 14), entre outras inferências observadas.
Para se ter uma ideia das disparidades que envolvem essa discussão, enquanto no Brasil a cultura política privilegia a iniciativa privada – no cenário nacional há apenas alguns exemplos isolados de universidades que monitoram regularmente as eleições, casos da Unicamp e da UFG -, nos Estados Unidos, por exemplo, ao menos 60 instituições de ensino realizam pesquisas eleitorais em parcerias com grandes veículos da mídia tradicional, como forma conferir mais credibilidade aos trabalhos.
Alguém pode ponderar que “pesquisa é fotografia, e não filme” para dizer que não há compromisso entre aquilo que é revelado pelos institutos e o resultado emergido das urnas. Embora haja verdade nisso – posto que pesquisa não faz prognóstico ou previsão para o futuro, limitando-se a retratar o momento em que fora realizada a investigação -, mas parte significativa da percepção coletiva tende a ser influenciada pelos números frequentemente trazidos à baila.
Daí porque, como contribuição ao debate público, apresentei como sugestão à UFRN a proposta de criação do Centro de Observações, Opinião Pública, Estudos, Relatórios e Avaliações (COOPERA/UFRN), vinculado à Superintendência de Comunicação da universidade, na perspectiva de termos um organismo isento, mediador da realização de estudos de opinião pública – a sugestão vale para UERN e UFERSA também.
Então não se admire, pois ao longo dos próximos meses as pesquisas de opinião, dezenas delas, farão parte dos seus dias, em Mossoró, Natal, Olho d’Água do Borges ou qualquer outro 5.567 municípios brasileiros, e não serão raros exemplos em que, para uma mesma cidade, duas pesquisas realizadas em intervalo mínimo de dias e sob metodologias similares, tragam resultados muito discrepantes, com o candidato A liderando com 2% de maioria em um dos levantamentos, e o candidato B na frente com 33% a mais na outra pesquisa.
Para não dizer que não falei em flores, ainda há um exemplo que merece menção, advindo da iniciativa privada: é o caso do instituto AtlasIntel, uma startup brasileira, sediada em São Paulo, pertence a um romeno radicado há mais de uma década no país. Tal instituto representa uma quebra de paradigmas no universo das pesquisas de opinião pública, pois que criou seu método autoral de coleta de dados, denominado Random Digital Recruitment (RDR), feito 100% via coleta web, e que desde 2019 apresenta os melhores resultados nas coberturas eleitorais, em termos de acertos, em vários países como Argentina, Colômbia, Chile, Espanha e Estados Unidos, e aqui mesmo no Brasil, onde as pesquisas foram as mais precisas em 9 dos 11 estados em que realizou levantamentos sobre as disputas locais, inclusive apontando tendências não capturadas por outros institutos, a exemplo da ‘virada’ de Elmano de Freitas (PT) sobre Capitão Wagner (UB), no Ceará, e de Jerônimo (PT) sobre ACM Neto (UB), na Bahia, da previsão de vitória de Marcos Pontes (PL) na disputa ao Senado, em São Paulo, e da projeção de vitória do Sérgio Moro (UB) para o Senado, no Paraná. Detalhe: precisão em resultados aliada à eficiência, hava vista o custo muito abaixo das pesquisas em relação ao cobrado por institutos tradicionais. AtlasIntel cobra até R$ 65 mil por um levantamento, enquanto IPEC (antigo IBOPE) chega a faturar mais de R$ 500 mil por um trabalho de mesma abrangência, e o Datafolha até R$ 600 mil, conforme tabela a seguir:
E aqui fica o alerta a você (e-)leitor: pesquisas acertam e erram, para mais e para menos, e por vezes elas podem extrapolar a margem de erro. Faz parte. No entanto, olho aberto para os casos em que esses trabalhos são financiadas informalmente por terceiros interessados, que chegam a desembolsar entre R$ 15 mil a R$ 50 mil por cada levantamento, e que claramente buscam fazer da junção entre pesquisa e fake news uma combinação danosa à soberania da vontade popular, na medida em que buscam induzir à manipulação de parcela do eleitorado, no particular desta abordagem.